Carta aberta a um ex-camarada de redação

Consideramos que o jornalismo é um bem público e deve ser acessível a todas as pessoas. Não o vemos como um negócio. Se assim fosse, daria lucro. E não dá.
Pedro Miguel Santos, Fumaça, 20.06.04

Caro José Eduardo Guimarães,
quem privou diariamente na redação de um jornal como nós privamos pode escrever sobre realidades nem sempre visíveis aos olhos dos leitores. Sem medos, tal como era apanágio noutros tempos; nos tempos em que existia jornalismo por terras vimaranenses.

Tiveste entre mãos projetos jornalísticos lindos e bem desenhados, infelizmente deixaste-os perder pela forma como não foste capaz de os gerir, deixando demasiadas marcas negativas no tempo. Mas eras e, pelos vistos, ainda continuas, um convencido de que eras jornalista. Não foste – percebeu-se logo que deixaste de ser correspondente do Público – tu fazes tudo para sobreviver; tu inventas ‘amigos’ para que te paguem as tuas loucuras de ocasião.

Hoje, parece que voltas a fazer de conta que tens – outra vez – um projeto jornalístico. Não tens, Zé; tal como há mais de vinte anos não paras de, vincadamente, provar como há uma certa forma de escrever a que alguns, entre os quais te incluo, fazem questão de chamar jornalismo. E tu não sabes o que é jornalismo!
O jornalismo, às vezes e em alguns sítios, pode parecer que o é; não é – porque o jornalismo não faz fretes ao patrão. Jornalismo não é, nunca foi, destilar palavras encantadas sobre incapacidades pessoais ou necessidades vaidosas. Ou favores direcionados que, dizem, permitem estar na crista da onda.
Jornalismo nunca foi – sei muito bem que em vinte anos tudo mudou no jornalismo e na sociedade; no mundo – exibir umbigos; por mais prominentes que eles possam ser.

Jornalismo, sabes Zé?, é uma ação séria, uma atitude formidavelmente séria!
Jornalismo não é só usar palavras lindas (quase sempre parvas e vazias) com desejos de pedestal.
E, assim, Zé, se para os vimaranenses tu já estavas esquecido – alguns recordar-te-ão com uma máquina fotográfica pelos corredores do poder; ali por Santa Clara , hoje olham-te com pena.

Zé, meu caro ex-camarada de redação, temo que nunca tenhas entendido a importância que os jornais e os jornalistas sempre tiveram e, hoje mais do que nunca, têm nos modelos de sociedade.
Zé, meu caro ex-camarada de redação, a vida na nossa idade, ensina-nos a ser ponderados, moderados e discretos. Às vezes, até fico tentado em tentar perceber certas coisas que vão acontecendo por aí; entre necessidades pessoais, verdade e desejos de afirmação. Mas depressa desisto, convencido de que nunca podemos pagar as nossas contas – tenham elas a dimensão que tiver – com valores que jamais pagamos; porque não os temos.
Termino esta missiva como um desejo muito forte: espero que não queiras, agora, ressuscitar fantasmas do passado. E o passado não te é nada favorável. Pelo menos no que ao jornalismo diz respeito.

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